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EMANNUEL KANT nasceu em 22 de Abril de 1724,na cidade de Koenigsberg,porto da Prússia Oriental.Nesta cidade passou quase toda a sua vida.Oriundo de uma família humilde de origem escocesa,era filho de J.Georg Kant,de profissão correeiro,e de Ana Regina Reuter.Teve três irmãs e um irmão,que foi pastor protestante em Altrahden,e ainda seis irmãs que morreram em tenra idade.Manteve-se celibatário durante toda a vida

" ...não seria exagero dizer que o tema da sua vida foi a luta pela liberdade espiritual ..."

Filosofia e Idéias

 


por Marco Antonio Prata Pinto, professor de filosofia no liceu D.João 21, em Faro, Algarve, Portugal.

O periodo de tempo em que decorreu a vida de Kant é marcado por grandes mutações políticas, religiosas e sociais.

Filosofia das Luzes, Revolução Francesa e também a ética protestante na sua faceta rigorista e ascética,o pietismo em que foi educado,estão associadas à filosofia de Kant.

Kant vai colocar no centro das suas preocupações o problema da acção: «Quer assegurar,nas melhores condições,o domínio da inteligência sobre os homens e as coisas».

Kant foi um expoente do Iluminismo,acreditava nele,foi o seu grande defensor. Mas se as Luzes tiveram o aspecto positivo de afirmar a liberdade do homem e a autonomia do seu pensar,tiveram também o aspecto negativo de desvalorizar a religião; a sua crença no valor da ciência tende a substituir Deus,a afastá-lo da acção quotidiana do homem.Kant vai lutar vigorosamente contra esta tendência das Luzes.

A Revolução Francesa foi um acontecimento político pelo qual Kant manifestou simpatia,poi vê nela,na continuidade da sua atitude «iluminista», não só a livre auto-determinação de um povo mas também o caracter moral da humanidade que permite esperar o progresso para o melhor. A fase de terror da Revolução Francesa levantou contra ela o resto da Europa e parecia dar razão aos que proclamavam que não se podia dar liberdade ao povo,porque este não estava preparado nem amadurecido para o seu exercício. Kant rebate esta objecção de impreperação e imaturidade argumentando que o amadurecimento para a liberdade se faz no uso e exercício da liberdade. A imaturidade para a liberdade é apenas e somente o argumento de todo e qualquer déspota para justificar a sua dominação.

A imaturidade não é um produto natural mas simplesmente a triste consequência da acção do déspota. O terror da Revolução Francesa não desautoriza o ideal de liberdade da nova República,pelo contrário,é a prova do efeito depravador do antigo regime.

A sua confiança no progresso da Razão,influência das Luzes,parece inabalável.Há,em Kant,uma crença generosa,----talvez ingénua,----no progresso moral da humanidade,na capacidade do homem se determinar livremente na sua acção. Confia no homem,enquanto pessoa moral,e se alguma reserva podemos hoje opor à filosofia de Kant ela reside na aposta exclusiva que ela faz do indivíduo.Toda a filosofia de Kant é concebida a partir dessa perspectiva estrita, nunca ultrapassando os limites do sujeito individual.

Kant combate «o materialismo,o ateísmo,a incredulidade dos livres pensadores», afirmando que só a Crítica os pode cortar nas suas raízes. A Crítica era a condição indispensável para «abolir o saber a fim de dar lugar à crença»;entenda-se: era preciso abolir o falso saber,fazer a Crítica das exageradas pretensões da razão especulativa para resguardar a fé. Mantém a convicção de que o Cristianismo é uma «Religião completa que pode ser apresentada a todos os homens» e que está destinada a converter-se na religião geral do universo.

Interpreta,contudo,a religião Cristã num sentido predominantemente moral.Considera que Deus,«como autor moral do mundo»,é a raíz da lei moral,os deveres que dominam interiormente o homem são mandamentos de Deus.

Ora esta interpretação essencialmente ética do Cristianismo é de origem Pietista.

Kant situa em planos distintos o que pertence ao conhecimento científico e à crença.A via para Deus não é a da razão teórica,esse foi um erro da metefísica dogmática,mas a do coração,a da moralidade,o que teria sido um ensinamento fundamental do Cristianismo. Parece,portanto,que a intenção de Kant teria sido a de perservar a crença.

A seguir uma síntese do pensamento deste grande filósofo:

A experiência é a origem do conhecimento,mas a sua validade só pode ser assegurada pela razão.
Os elementos do conhecimento são oriundos de duas fontes:
a)Uns dependem do próprio objecto e são a matéria do conhecimento.
b)Outros dependem do sujeito e constituem a forma do conhecimento.
Conhecer consistirá então em unir uma matéria com uma forma;aquela,porque depende do objecto,será variável de objecto para objecto e só pode ser fornecida A POSTERIORI;esta,porque depende do sujeito,é sempre a mesma e é A PRIORI.O espírito impõe as suas formas ao objecto e este tem de se lhes conformar,porque de outro modo não o poderiamos conhecer.
A Razão é a fonte das proposições universais e necessárias,portanto,podemos concluir que a razão produz por si mesma conhecimentos:os que são A PRIORI.
É facto que as proposições da matemática e da física são universais e necessárias,logo A PRIORI,e ninguem dúvida que tais proposições sejam verdadeiro conhecimento.
-O conhecimento científico explica-se por juízos sintéticos A PRIORI.
-Estes juizos são simultaneamente universais,necessários e extensivos.
-Não se podem fundamentar na experiência,porque só a razão pode ser a fonte de proposições universais e necessárias.
-Conhecer consistirá numa síntese entre a forma universal,própria do sujeito,e uma matéria fornecida pela experiência.
O imperativo categórico diz-nos:
-Faz somente aquilo que possa ser universalizado.
-Considera o outro como pessoa porque ele é um fim em si mesmo e não um meio de que te possas servir(isso seria reduzi-lo à condição de objecto).
-A vontade de um ser racional é autónoma.

A vontade humana nunca se liberta totalmente das inclinações sensíveis.

-A vontade é sensível ou empírica enquanto é afectada pelos mobiles da sensibilidade,nesta medida é dependente.

-A vontade é pura enquanto racional,criadora da própria lei moral,nesta medida é independente ou autónoma.

-Se no homem há uma vontade pura,não existe todavia uma vontade santa.

-A santidade da vontade é um modelo ou tipo ideal de que o homem se deve aproximar cada vez mais.

-Vontade:casualidade dos seres racionais.

-Liberdade=autonomia=submissão às leis da razão=moralidade.

-Vontade livre é a que age moralmente.

-Soberano bem=virtude+felicidade.

-Felicidade supõe um acordo entre a ordem da natureza,os desejos do homem e a lei moral.

-O homem não é o autor da natureza,logo,quando obedece à lei moral,não pode estabelecer o acordo entre os seus desejos e a natureza.

-A harmonia destes três elementos é necessária à realização do Soberano Bem.

-Então é preciso admitir uma causa supra-sensível que criou a natureza de tal modo que tornasse possível esse acordo.

-O autor do mundo tem de ser simultaneamente uma inteligência e uma vontade=Deus.

-Deus tem de existir.

-Deus criou o mundo com o objectivo de realizar o Soberano Bem,e não a felicidade dos homens;a felicidade destes depende da sua moralidade.

-A acção humana é a de uma pessoa moral e não a actividade de um sujeito cognoscente.

-O homem,pela razão prática,realiza a sua dimensão de pessoa.

-Ser pessoa implica ser livre nas suas acções,ser autónomo.

-Imortalidade da alma e existência de Deus são postulados como uma exigência ética.

-O primado da razão prática revela que a filosofia Kantiana tem uma preocupação essencialmente ético-religiosa.

-A ética possibilita uma nova metafísica e abre o caminho para a religião.

-Abolido o «saber» pela Crítica obtém-se um «lugar para a crença».

-O fundamental é que o homem se saiba auto-determinar=regular a sua acção de acordo com a lei universal que ele próprio criou,libertando-se do determinismo natural.

-O cerne do filosofar incide assim sobre a auto-determinação do homem.A sua pergunta fundamental é:Que é o homem?  Um ser racional finito.

Kant pusera-se três questões:

a)Que podemos conhecer?
b)Que devemos fazer?
c)Que nos é permitido esperar?

Podemos agora responder:

a)Podemos conhecer a ordem dos fenómenos no espaço e no tempo.
b)Devemos fazer o nosso dever.
c)Podemos esperar o Soberano Bem.

Kant foi um homem de hábitos extremamente regulares e estabeleceu para si próprio uma disciplina de vida que pareceu ter cumprido escrupulosamente,raramente infringindo os seus hábitos. O testemunho dos alunos é unânime quanto aos seus dotes de professor;os seus cursos eram seguidos com agrado e os ouvintes ficavam presos à vivacidade e clareza da sua exposição. Viveu sempre modestamente e na fase inicial de sua carreira a um nível próximo da miséria.

KARL R. POPPER «Kant,filho de um artesão,foi enterrado como um rei. No dia do funeral a vida na cidade parou. O caixão foi seguido por milhares de pessoas,enquanto tocavam os sinos de todas as igrejas.Os cronistas dizem que nunca se vira nada assim em Koenigsberg. É difícil de explicar essa espantosa eclosão do sentimento popular... para os seus conterrâneos, Kant tinha-se transformado num símbolo dos ideais da Revolução norte-americana e da Revolução Francesa. Eles vinham portanto demonstrar a sua gratidão ao mestre dos direitos do homem,da igualdade perante a lei,da cidadania mundial,da paz universal e, possívelmente, o mais importante,da emancipação pelo conhecimento... não seria exagero dizer que o tema da sua vida foi a luta pela liberdade espiritual».

 

JOHANN G. HERDER

«Tive a felicidade de conhecer um filósofo que foi meu professor. Em plena força da idade tinha o bom humor de um adolescente e julgo que o conservou até à idade mais avançada... Abundante de ideias,a palavra brotava dos seus lábios; espírito e humor nunca lhe faltavam;e o seu ensino era um dos assuntos mais interessantes.

Era com a mesma curiosidade de espírito que examinava Leibniz,Wolff,... Hume,que seguia as leis da natureza de Kepler,de Newton e dos físicos,que acolhia os escritos recentemente aparecidos de Rousseau,... como qualquer descoberta da natureza que lhe era dado conhecer. ...este homem, de quem evoco o nome com extrema gratidão e o maior respeito,é EMMANUEL KANT».