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ENCONTRO DE QUADROS DO CNRT 

 DECLARAÇÃO FINAL


Teve lugar, nos dias 15, 16 e 17 de Janeiro, um Encontro Geral dos Quadros do CNRT, vindos dos Sub-distritos e Distritos, para debater questões cruciais do processo.

Fez-se uma análise profunda do papel desempenhado pelos quadros do CNRT e da sua missão fundamental de organizar a resistência do povo de Timor contra a ocupação militar indonésia por longos e difíceis anos.

Recordou-se ainda a sua missão histórica de mobilizar o povo para o Referendum de 30 de Agosto de 1999, numa fase extremamente perigosa que culminou com a destruição total verificada no mês de Setembro seguinte.

Foi também lembrado todo um longo período de sacrificios, de total entrega, de excepcional coragem dos quadros do CNRT para enfrentar os perigos que os espreitavam nas suas actividades como quadros de uma ampla organização clandestina que vivia lado a lado com o sofisticado aparato repressivo do inimigo.

I - 1. Foi largamente considerado, na Reunião que o Congresso do CNRT, realizado de 21 a 30 de Agosto de 2000, decidiu que as estruturas do CNRT dessem lugar, aos poucos, às estruturas administrativas, para se evitar o paralelismo de estruturas.

Contudo,

     a. devido à grande morosidade na implantação de uma estrutura administrativa REAL e EFICIENTE no terreno,

     b. aliado ao facto de os internacionais colocados nos distritos e sub-distritos, só falarem inglês e pouco ou nada conhecem da realidade timorense

     c. e com intérpretes, jovens com pouquissima capacidade de interpretação e sem nenhuma experiência de contacto com as realidades sociais, pelo que deturpam a seu bel-prazer (igual a "a seu belo desconhecimento") a análise dos problemas,

os quadros do CNRT sabem que sem uma sua participação directa ou indirecta no processo, os problemas irão acumulando-se dia após dia, com difícil solução.

2. Todos os quadros expressaram com grande desapontamento que, na generalidade, até mesmo ao nível dos sub-distritos, os internacionais da UNTAET e instituições internacionais não demonstram a mínima consideração para com os quadros do CNRT, como se o CNRT fosse um partido político que tem como estratégia a sua destrutiva implantação nas massas. Tal é a ignorância sobre a realidade timorense que eles (internacionais) consideram que as eleições levadas a cabo pelo CNRT até ao nível dos sucos, para suplantar a confusão de 2 estruturas (administrativa/indonésia e clandestina/resistência timorense), foram do CNRT e as estruturas são do CNRT.

A arrogância de pensarem que eles (staff da UNTAET e instituições internacionais) vieram salvar o Povo de Timor das garras opressoras do CNRT (e qualquer referência a um quadro do CNRT é logo considerado "bias" ou "political apointment"), como dizia, essa arrogância, própria de estrangeiros, permite a eles pretender que só algo fora do CNRT pode dar oportunidade a "outras" forças políticas, nomeadamente aos pro-autonomia (que esses mesmos internacionais não sabem que significa "pro-integração na Indonésia").  

3. Mas notou-se também um outro fenómeno que só revela a ineficácia, a incapacidade desse staff internacional nos Distritos e sub-distritos (assim também ONGs internacionais e nacionais ou timorenses envolvidos em projectos 'internacionais'). Vão decididos a não contactar ou coordenar com os quadros do CNRT, sobretudo com a ideia de que assim evitam a corrupção ( os quadros do CNRT poderiam ficar com os produtos alimentares, ficar com os zincos e cimento para fazer as suas casas, etc, etc). 

Porém, por causa da maneira mais estúpida como as ONGs e outras Agências fazem as distribuições, relatadas como 'directamente à população' (mas não a toda a população e sem critérios definidos e explicação adequada) sempre que surgem problemas, aparecem também 2 situações: ou a culpa é dos quadros do CNRT porque não ajudaram a 'acalmar' a população ou os quadros do CNRT são, então, chamados para ajudar a resolver os problemas.

O mesmo acontece por parte de tantos internacionais da UNTAET, (Administradores, CIVPOL, staff de toda a ordem que pululam em todo o território). Não ligam pura e simplesmente aos quadros do CNRT. Em contraste, hoje, em Timor, os intérpretes locais (com baixissima qualidade, que confundem as palavras e deturpam o sentido das frases) são as PESSOAS-CHAVES do processo de uma administração pesada e ineficaz, cuja preocupação central é realizar meetings diários, sem substância e sem resultados concretos, quanto mais visíveis.

E quando os problemas aparecem, esses ganhadores de bons salários (que vêm de todas as partes do mundo e alguns sem nenhuma experiência), chamam os quadros do CNRT para os ajudar a resolver os problemas. 

II - 1. Como que a juntar o útil ao agradável, os quadros do CNRT manifestaram também a sua profunda preocupação em relação ao campo político.

 Há grupos políticos que, arvorando a bandeira da Liberdade, lançaram-se a organizar a população a partir das aldeias e sucos, criando confusão na população. O CNRT, no seu Congresso, definiu que os Partidos deveriam ser partidos de quadros e não partidos de massas.

A experiência política de 25 anos atrás, com a distribuição de cartões até às aldeias e sucos, dividindo o povo que depois entrava em violência, quando os líderes políticos não se entendiam, não deve nunca ser esquecida.

Os quadros do CNRT lamentam que, apesar de tudo o que aconteceu em Setembro de 1999, sobretudo em termos de morte e sofrimento para o nosso Povo, políticos e líderes não se tenham compenetrado da enorme responsabilidade que os partidos políticos têm pela frente - a de garantir ao povo o seu direito de viver em harmonia, paz e sossego. Esta condição é fundamental para que o Povo trabalhe e tente melhorar, pouco a pouco, as suas míseras condições de vida. 

2. A população está aflita perante a situação confusa que a perturba.

Elementos que participaram com o General do Kopassus, Zacky Anwar, na fundação do PNT (um partido pro-autonomia), no Hotel Mahkota, durante o processo da Consulta Popular, hoje proclamam-se defensores da RDTL (República Democrática de Timor-Leste, proclamada unilateralmente pela FRETILIN em 28 de Novembro de 1975), apresentando-se como uma facção da FRETILIN.

A dita CPD-RDTL já começou a implantar-se em várias localidades, utilizando o engano e ameaças, recrutando ex-milícias e incitando mesmo à violência. Mobilizam jovens, a partir de Díli, para as suas 'campanhas' no interior e estes jovens, na maioria, não pertencem às organizações juvenis clandestinas, porque estavam afectos ao aparato da inteligência indonésia, desordeiros por natureza.

Uma pergunta surge, sempre que olhamos para as actividades do grupo da RDTL: donde vem o dinheiro que permite à CPD-RDTL sustentar estas actividades? 

3. De igual modo, outros grupos tentam instalar-se até às bases, pondo a população perante o dilema: ouvir o Chefe do suco? Ouvir o Conselho, criado pelo Banco Mundial para o CEP (Community Empowerment Project)? Ouvir o Responsável do Partido na aldeia e no suco?

Começa-se a dizer que, ao Chefe do Suco, NÃO, porque é do CNRT e o CNRT já não vale e vai morrer brevemente. Ao Chefe do Conselho, sim, porque é através do Conselho é que o dinheiro do Banco Mundial vem. Mas ao Responsável do Partido, SIM, porque agora é liberdade e cada partido deve organizar-se.

Outros, aproveitando a ignorância democrática da população, ainda ameaçam com as Falintil, fazem recenseamento, etc.

Quando os quadros do CNRT tentam esclarecer a população e alertá-la para as consequências nefastas do divisionismo, são logo tomados como violadores da liberdade, como anti-partidos e, portanto, anti-democráticos.

III - 1. Perante esta complicada situação, os quadros do CNRT debateram com muita profundidade o seu papel nesta fase de transição. Chegou-se a considerar a hipótese de, a partir de agora, os quadros do CNRT deixarem de preocupar-se com o processo, para que cada um comece a pensar na sua vida privada, cheia de preocupações familiares (e desde 30 de Agosto de 1999, continuam leais ao princípio de servir o povo, sem nenhuma remuneração).

Os quadros do CNRT manifestaram entretanto a sua enorme preocupação com o facto de deixarem a população à mercê dos internacionais e dos intérpretes locais, uns e outros igualmente incapazes, totalmente desligados da realidade social, cultural e política em Timor, e que apenas se completam na missão de receber salários da UNTAET, que aparece como a estrutura de um poder um tanto ou quanto supérfluo.

Os quadros do CNRT manifestaram também a sua grande preocupação com o escalar da violência, por irresponsabilidade de grupos políticos.

2. Os quadros do CNRT decidiram que JAMAIS ABANDONARÃO O POVO NESTAS CIRCUNSTÂNCIAS! COM ELE LUTARAM, COM ELE SOFRERAM E COM ELE VENCERAM! E OS QUADROS DO CNRT VÃO CONTINUAR AO LADO DO POVO, NESTE PERÌODO EM QUE ELE AINDA DELES NECESSITA!

Quando tanto o processo político como o da timorização tiverem assegurado confiança e clima de estabilidade junto do Povo, os quadros do CNRT serão apenas pessoas anónimas em uma sociedade, onde políticos e intelectuais terão papel importante a desempenhar. 3. OS QUADROS DO CNRT EXIGEM: 

     a) à UNTAET para reconhecerem o papel dos quadros do CNRT, na transição à independência

     b) a todo o staff internacional, operando em Timor, que coordenem as suas actividades com os quadros do CNRT ( e fique claro que nenhum quadro do CNRT pedirá pagamento pela sua participação)

     c) uma melhor preparação dos intérpretes da UNTAET e utilizá-los meramente nas suas funções de intérprete e não como 'experts da realidade timorense' ou 'fontes de dados da UNTAET'

     d) aos grupos e partidos políticos para refrearem a ânsia ao poder e pensarem em termos de garantir ao povo, sossego, tranquilidade e tolerância.

ESTE É O TEOR DA DECLARAÇÃO FINAL DOS QUADROS DO CNRT.

Sede do CNRT, em Balide, aos 17 de Janeiro de 2001.

O Presidente do CNRT/CN, 

Kay Rala Xanana Gusmão