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CNRT/Congresso Nacional

Presidência

Alocução

Para a Cerimónia de Dissolução do CNRT/CN, no Estádio de Dili

 Ilustres Convidados

Companheiros da Luta

Povo de Timor Lorosa’e

26 anos depois de uma luta heróica e difícil, abre-se um novo capítulo na história de Timor Lorosa’e, um capítulo virado para o futuro.

É realmente um futuro cheio de expectativas e esperanças, mas com um presente vivido pelo nosso Povo, com muitas preocupações e angústias. E estas preocupações e angústias resultam de muitos factores, sobretudo no campo político.

A apreensão legítima do nosso Povo quanto a um regresso à violência, promovida pelos partidos políticos, como no alvorecer político do passado.

Apreensão legítima do nosso Povo quanto à actuacão de alguns partidos que vão até às bases registar desenfreadamente as pessoas, no conceito de partido é povo e povo é partido.

Apreensão legítima do nosso povo quanto às intimidações que se promovem, se se não votar num ou noutro partido, fazendo a população recordar as consequências das campanhas pela autonomia.

Apreensão legítima do nosso povo quanto à ainda falta de cometimento por parte dos partidos para o seu envolvimento na campanha da educação cívica, ao invés de promoverem ataque uns aos outros pela rádio, televisão e jornais.

Apreensão legítima do nosso povo quanto ao comportamento de algumas organizações políticas que impõem os seus pontos de vista, através do boicote ao processo e à violência.

Apreensão legítima do nosso povo quanto à não interiorização, por parte dos partidos, da necessidade premente da promoção dos valores democráticos de tolerância e de mútuo respeito, da liberdade e dos direitos humanos, da reconciliação e da justiça, como fundamento para uma plataforma de pensamento e acção que todos deveriam observar e defender.

Não é intenção apresentar aqui um cenário negro do processo, quando se abordam estas apreensões do nosso Povo. A intenção é de criar uma consciência nacional da necessidade de se garantir um ambiente de estabilidade política ao processo. Conscientes e preocupados com esta realidade política, os participantes da Conferência Extraordinária para a Dissolução do CNRT exigiram a presença de todos os partidos e organizações políticas, para um cometimento público para a estabilidade e paz no seio do povo. Foi um acto de apelo às forças políticas do país e foi transmitida uma mensagem a todos os componentes da sociedade timorense.

No ar paira um desafio, difícil e complexo: os timorenses são ou não são capazes, os timorenses estão ou não estão preparados, os timorenses ganharam ou não ganharam maturidade política, ao longo destes anos de sofrimento e de dor de todo o povo!

Conscientes contudo desta realidade política, os quadros do CNRT assumem que este é o momento exacto para a sua dissolução.

Companheiros da longa e difícil Jornada de 25 anos

Para se tomar esta difícil decisão, foram precisos vários factores:

    • Coragem para aceitar a realidade nas suas mudanças
    • Humildade para não reclamar os vossos actos no passado
    • Nobreza no cometimento pessoal e colectivo ao processo actual

E estes factores revelam a vossa maturidade política.

Vós escrevestes as páginas mais douradas da nossa História. Vós, quadros da Resistência Clandestina, juntamente com as Gloriosas FALINTIL, fizestes a nossa História. Vós estais registados na nossa História: Jovens, Mulheres e Homens!

Como já afirmei, na abertura da Conferência, de mãos dadas com as FALINTIL, vós fostes os verdadeiros obreiros do 1º país independente do novo milénio. E, como não podia deixar de ser, juntam-se a vós os vossos irmãos da frente diplomática.

Deveis orgulhar-vos disso. E o nosso Povo orgulha-se de vós!

Queridos companheiros

Somos, a partir de hoje, cidadãos comuns. Se levamos a mágoa de termos despido a auréola da luta que nos envolvia, como membros de uma organização da dimensão histórica que foi o CNRT, sentimos também a satisfação de tirarmos dos nossos ombros todo um ambiente complexo de antipatia, desconfianças e mesmo de acusações.

A partir de hoje, vamos olhar para o futuro. Vamo-nos esforçar por nos apoiarmos mutuamente para nos mantermos como uma individualidade colectiva, com o espírito de solidariedade para com os seus membros. Cada um vai fazer as suas opções políticas mas a Associação dos Veteranos da Resistência será uma Organização Não-Governamental, sem fins lucrativos nem objectivos políticos.

Vamos partir para outra luta, a satisfação das nossas necessidades como seres humanos, como cidadãos empenhados em apoiar o processo de desenvolvimento de Timor Lorosa’e, contribuindo assim para a melhoria das condições da vida da nossa população.

Povo de Timor Lorosa’e

Uma última palavra para vós. Vivemos juntos, lutamos juntos e sofremos juntos para libertar a Pátria. Juntos vencemos a guerra, juntos conquistamos a liberdade.

A independência não é um fim, mas apenas um meio para que todos os timorenses participem no processo de construir a nova Nação. Os partidos políticos é que vão governar Timor Lorosa’e.

Compete aos partidos respeitar agora um direito fundamental do povo, o direito à estabilidade, à paz. O povo já não quer mais violência. O povo espera que o Setembro sangrento de 1999, seja o último acto de violência em Timor Lorosa’e.

Sem estabilidade, sem paz, não haverá democracia, não haverá progresso. Vamos continuar a pedir aos partidos políticos o compromisso de assegurar ao povo um clima de paz.

Mas vamos também empenhar-nos a distinguir os pregadores da intolerância e da violência dos que defendem a tolerância e a harmonia.

O processo é difícil, porque construir das cinzas algo novo, é sempre difícil. Se em 24 anos ninguém prometeu a ninguém quando é que a guerra terminava e mesmo sob pressões de toda a ordem, continuavamos a lutar confiantes na vitória, hoje vamo-nos encher de novas forças, de nova determinação e do mesmo espírito de fé e de confiança que nos uniu.

Tenhamos confiança no futuro, um futuro de melhoria das condições de vida de todo o povo, sabendo de antemão que todos temos que trabalhar muito para que isso aconteça.

A independência, afinal, não é termos uma bandeira, um presidente, um parlamento, um governo. A independência deve significar, cada ano, mudança gradual na vida de toda a população de Timor Lorosa’e. Se não se conseguir produzir alguma mudança no dia-a-dia das populações, a independência não terá sentido, todos os sacrifícios consentidos durante a luta serão em vão. E nenhum de nós permitirá isso.

Mas, entretanto, pede-se paciência, pede-se novo espírito de sacrificio.

VIVA O CNRT! VIVA A UNIDADE NACIONAL!

VIVA A MULHER TIMOR ! VIVA A JUVENTUDE LORICO ASWAIN!

VIVA O POVO DE TIMOR LOROSA’E!

Kay Rala Xanana Gusmão          

Presidente do CNRT-CN          

Aos 9 de Junho de 2001