No pequeno hall em frente a uma das salas de convenções do hotel Crowne Plaza, em São Paulo, um grupo alheio àquele ambiente encostava-se às paredes do cômodo, esperando as portas abrirem-se. Entre VJs e produtores, gente de banda, selos e até o Supla (nada a ver, mas era o Supla), pouco mais de uma centena de curiosos e enturmados transitava pelos corredores e escadas causando estranheza aos funcionários acostumados com paletós e jóias no cofre.

Foi o melhor lugar que o Pin Ups conseguiu para lançar seu novo disco, Bruce Lee (Short), em um curto show acústico. E, apesar do ambiente oposto a um mercado que se conta as notas de R$ 1,00, a escolha provou-se acertada. O auditório funcionou como um pequeno teatro, território até então inédito para a banda pioneira do indie nacional. À frente de cortinas douradas e contando com as participações de Brown (baterista do Automatic Pilot), na percussão, e da bela Angela Detanico, aos teclados, os Pin Ups começaram o fim de sua segunda fase.

Iniciada no disco Jodie Foster, de 95, este período de transição coincidiu de ser marcado pelo que o grupo chama de "trilogia cinematográfica". Batizando seus últimos três discos com anti-heróis do cinema americano, o grupo vem passando por uma mutação lenta e gradual, fazendo-o descer do andar noise para o do dito rock alternativo, ultrapassando o punk rumo à new wave.

A mudança sonora é obviamente decorrente da mudança na formação do grupo. O antigo vocalista, Luís Gustavo, abandonou o barco logo após o lançamento de Jodie Foster e o terceiro disco da banda era o que trazia a estréia da baixista Alê como vocalista num disco do Pin Ups (a outra participação havia sido no projeto paralelo do grupo, o Gash). A troca do time foi fundamental para o novo rumo que o grupo passava a apontar: mais direto e melódico, a nova fase do grupo paulistano transformava a intensidade estático do noise de seus shows em uma energia mais dinâmica, mais americana que inglesa.

Lee Marvin, do ano passado, confirmou a baixista como nova voz e, claro, novo rosto do grupo. O guitarrista Zé Antônio se distancia do holofote central numa espécie de auto-referência, como se criasse uma redoma própria dentro daquele novo grupo. As mudanças na formação continuariam com a inclusão da guitarrista Eliane (depois de tentar outros músicos - entre eles, o baiano Peu, do Dois Sapos e Meio) e do baterista Flávio, que assumiu depois que o baterista original - Marco -, caiu fora para se dedicar ao seu maior amor musical - a garageira barulhenta que une suas duas novas bandas, o Butchers’ Orchestra e o Red Meat.

O show da penúltima sexta-feira apenas consagrava o novo Pin Ups. Acústico ma non troppo (o show contava com os teclados e com, quase ao final, com a guitarra elétrica de Zé), a apresentação teve uma das mais belas iluminações na história do indie brasileiro. Empunhando violões e baixo acústico, o grupo equilibrou-se entre versões inspiradas e execuções formais de alguns de seus hits.

Grande parte do repertório da noite saiu dos hits de Jodie Foster e Lee Marvin (como Witkin, Weather, On Your Own, Feel So Strange, Guts) quase todos tocados em arranjos convencionais, cuja modificação era mínima, mais especificamente na velocidade imposta dos instrumentos deplugados. Mas o clima intimista da noite transformou esta burocracia em descontração, com Alê e Zé brincando com o público que contentava-se em ouvir suas músicas conhecidas tocadas ao violão.

As versões mostraram o potencial do novo Pin Ups. Imerso na melodia, eles deitaram e se espreguiçaram sobre Jackass (do Beck, com um excelente arranjo), Nowhere Near (do Yo La Tengo) e Detroit Has a Skyline (do Superchunk). A versão dos Beatles, Revolution (com o solo citando 3rd Stone from the Sun, do Jimi Hendrix), no entanto não convenceu - como a de The Model, do Kraftwerk, presente apenas na faixa 12.12.98, no novo disco. Esta, última canção do disco, é na verdade a íntegra de outro acústico, apresentado na data que a batiza. Ali pode-se ter uma perfeita noção do show de lançamento de Bruce Lee.

Mas o disco explica-se melhor com as faixas novas, que condensam toda nova fase do grupo. To All Our Friends casa a doce e monótona melodia com uma sucessão acordes precisos e arrojados que apagam de vez as muralhas de microfonias que eram marca registrada da primeira fase do grupo. Growing Up segue o ritmo, diminuindo a velocidade para enfatizar a beleza da canção. Uma faixa sem título, meio orientalesca, meio psicodélica, pode estar apontando para as novas viagens sonoras do grupo e pode ser apenas uma forma de nos despistar - mas prova que o quarteto não está disposto a acomodar-se. Assim, o acústico que segue-se em 12.12.98 funciona apenas como o adeus à fase de transição - mas um adeus sorridente, assistindo com ansiedade uma nova etapa. Boa sorte Pin Ups - se bem que vocês não precisam.