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01.02.1999

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Por Thaís Aragão

Dago Red acabou de lançar seu primeiro CD. Sabe o que isso significa? Significa que é o terceiro CD de guitar bands fortalezenses lançado. Esse negócio de guitar bands é bem dessa década mesmo, não é? Em 95 aconteceu um festival na cidade, o Microfonia. Foi organizado pelo pessoal dos Seres Urbanos, grupo de fanzineiros no qual eu não estava incluída na época. Reuniu apenas bandas que seguiam aquela linha alternativa que estava se desenhando no contexto internacional. Eram ao todo cinco e cantavam em inglês. O evento serviu para se criar um mito de que existia uma cena na cidade. Muita gente duelou por besteira, inclusive eu.

Havia a Velouria, que levava uma de unânime; a Dead Poets, que levava uma de sensível; a Banana Scrait, que levava uma de simplória açucarada; a Heaven Up, que levava uma de posista; e a Dago Red que levava uma de esporrenta. As três primeiras bandas fazem parte do cast do selo de demos indie carioca midsummer madness. Velouria e Dead Poets mal gravaram um CD split e acabaram. A Heaven Up deixou uma demo de três canções para a posteridade. O Banana Scrait lançou um CD com as mesmas músicas que já havia na demo e faz shows muito esporadicamente. Houve um tempo em que todo mundo pensava que a Dago Red ia morrer, mas sem muito estardalhaço retomou o caminho e está com Spleen na mão. São quinhentas cópias iniciais. Então agarre o seu e leia algumas palavras do cara que canta, Robério Augusto.

BR-116 - Como é o som?
Robério Augusto -
É pop mas não é uma coisa massificada. É uma coisa que não causa muito espanto. Até mesmo as pessoas mais velhas, tipo tio, avós, quando vêem acham legal. E como está sendo cantado em inglês e eles não sabem o que está sendo cantado, a primeira coisa que chama atenção é aquela história ‘ah, como você se expressa bem!’

BR-116 - E se soubessem o que canta?
Robério Augusto -
Aí mudaria um pouquinho, mas mesmo assim acho que o espanto não seria tão grande, não. O espanto maior seria se nos vissem tocando ao vivo.

BR-116 - Como era quando começou a banda?
Robério Augusto -
É engraçado, porque a Dago Red, a rigor, é a minha primeira banda. É interessante como você é o reflexo da época que você vive. Naquela época a gente já tocava punk rock, mas era com outro tipo de orientação. E quando a gente começou não era muito bem definido isso. A identificação com o rock alternativo se deu porque na época tinha uma porrada de coisa que a gente não estava gostando. No final da década de 80, começo dos 90, as coisas estavam muito ruins no pop (os Smiths tinham acabado, tinha ainda o [Jesus And] Mary Chain, das bandas que eu gostava). A nova geração de bandas inglesas da época, EMF, Soup Dragons, eu não gostava muito. Tinham umas bandas de hardcore que eu achava legais, começaram a ficar trash, tipo TRI. Eu comecei a ouvir e eu tinha muitos amigos head bangers. Aí eu disse 'eu vou ficar mostrando disco do Joy Division pra eles e eles me mostrando disco do Metallica'. Teve uma época em que eu comecei a ouvir muito trash. Fiquei ouvindo, ouvindo mesmo; comprei camiseta do Metallica. Eu estava ouvindo muito disso na época.
Aí saiu o New York, do Lou Reed. ‘Ah, voltei!’ Voltou aquela coisa que eu gosto. Quando começou a surgir Nirvana e vieram à tona Sonic Youth, Pixies e essas coisas, bateu mais pela sonoridade, mas a gente não pensava o quê que iria acontecer. Começava-se a se falar muito nessas duas palavras – eu acho que são as palavras fortes dessa década de 90 – que são "alternativo" e "teen". Por causa da música do Nirvana e tal. Aí se começou a falar em rock alternativo se referindo a esse tipo de rock, que era um pop rock com fortes influências do punk, mas que agregava outras tendências. Aí a gente tocava umas músicas dessas bandas que a gente ouvia. Quando começaram a rolar nossas primeiras músicas, foi aí que a gente começou a ter uma identificação. Porque tinham as bandas do Brasil também na época, o Second Come, o Pin Ups, Killing Chainsaw, esse pessoal todinho. E a gente viu que a gente era desse time, mas era muito claro o fato de que a gente não era totalmente aquilo que se convencionou chamar de guitar band. Como tem que definir, então usamos. Se a gente tivesse que escolher, a gente não era do time dos punks. Tava na cara. A gente podia ser até um pouquinho mais agressivo do que as bandas que eram mais melódicas, mas aí a gente não era libertário, não tinha música engajada, não tinha esse tipo de preocupação que o punk rock pós anos 70 começou a ter.

BR-116 - Mas existe algum tipo de preocupação?
Robério Augusto –
Nas músicas da gente? Não. (pausa) Quando a gente começou a tocar, a coisa foi ficando assim ‘ah, nós temos que gravar uma demo’ e aquela história ‘ih, temos que escrever um release’. E eu: ‘'pô, vou dizer o que?’ Aí o quê que eu fiz? Pra não utilizar alternativo, porque na época estava começando a massificar o termo e muita gente já estava criticando, eu citei ‘college rock’, que é um tipo de som mais específico, mais dessas bandas como Pavement, Pixies etc. Na época a gente viajava muito em ler escritores do tipo Bukowski, Rimbaud, surrealistas e tal. Então a gente citou isso, mas sem um pingo de intenção de mostrar que era uma coisa "cabeça". Não tinha uma preocupação explícita.

BR-116 - Não tem preocupação, mas o Dago Red não é uma banda alienada...
Robério Augusto -
Não, muito pelo contrário. Não é aquele tipo de coisa ‘ah a gente fala sobre qualquer cois, ou fala sobre bobagem ou as letras não fazem sentido’. Tem muita gente que viaja naquela coisa do Frank Black. Mas eu acho que as letras dele não são tão sem sentido. Nonsense não significa necessariamente coisas perdidas. E as músicas têm um teor existencial muito forte. As coisas da gente são bem existenciais, por isso eu não acho que sejam alienadas nesse sentido. Elas não são engajadas politicamente mas possuem um teor político porque é um indivíduo que está questionando a situação dele no mundo. Mesmo que ele não esteja questionando explicitamente como aquelas letras punks engajadas, mas tem um tipo de abordagem que é psicológica.

BR-116 - Como é ser uma banda dita alternativa, cantar em inglês e estar no Brasil?
Robério Augusto -
A gente poderia ter começado a cantar em português, se quisesse. Mas foi uma opção saber que, cantando em inglês, teria um público restrito. Então não chega a ser um peso porque foi uma escolha. Mas a gente é sempre minoria, não é muito bem visto por gravadoras, por revistas. Agora, uma crise que eu vejo na cabeça dos alternativos é que eu acho que eles são falsamente alternativos. Não é uma busca do estrelato que me move, digamos. Eu não entro muito em crise quanto a isso. Já entrei mais. Essa crise não é com o fato de não ser popular, é com o fato de, dentro do próprio meio underground, a gente não consiga uma notoriedade, não consiga respeito. Aí isso me magoa. Vem uma revista Showbizz e abre uma sessão supostamente pra música alternativa ou música independente. Aí só entra música independente cantada em português que é crossover ou mistura de ritmos. Aí eu acho chato. Isso é uma coisa que frustra. Mas quanto ao fato de tocar guitarra distorcida, cantar em inglês, fazer esse tipo de som, não.
A chateação é essa: parece que no underground brasileiro a gente tem dois escalões: um underground mais light e um mais radical, e não se estabelece uma ponte entre os dois. O mais radical é esse formado por esse hardcore fudidões, black metal, death metal... E esses caras têm um público mesmo. Basta olhar pra cena daqui. As bandas podem ser uma porcaria, mas o cara que tem uma banda de heavy metal tradicional sabe que se ele for tocar e a banda dele for mais ou menos, dá duzentas, trezentas pessoas. O cara organiza um show com três, quatro bandas de hardcore. Pode ser um monte de pivete que não sabe nem tocar direito, mas dá gente pra caralho. Porque é o som da onda, é o som da hora. E no caso da gente, não. A gente fica meio perdido.
O escalão mais light é o dos mangue beat, dos crossover, rap rock, rapcore, de não sei o quê mais, dessas bandas que estão indo pra Abril Pro Rock, que estão indo pra Garage, que estão cantando em português e fazendo esse som, sons que às vezes são chatérrimos. Essa nova geração ou é de Salvador ou é de Recife ou made in Rio, aquelas coisas meio Planet Hemp. Acho que não é tão radical assim quanto essas bandas mais fudidonas. E a gente fica onde? Não fica. Fica num gueto mesmo, bem pequenininho e uma vez ou outra é que se abre uma porta. Aí vai numa Expo Music e chamam um Stellar pra tocar bem ali, chamam um Pin Ups uma vez ou outra pra tocar no Abril Pro Rock. É muito esporádico.
Às vezes eu tenho a impressão de que esse underground mais light é meio que um mainstream às avessas. Mesmo com MTV, com revistas específicas, mas eu acho que o padrão de comportamento das pessoas de tevê, dos caras de gravadoras, dos caras de jornais ou revistas (aí eu inocento os zines; os zines continuam, pra mim, puros deste processo), eu acho que os caras ficam criando uma panela em torno de coisas como se fosse um mainstream menor. Eu vejo como se houvesse uma cúpula do alternativo e tem uma reca que está abaixo disso. Eu não gosto.
Eu acho isso chato porque a gente não está criando uma estrutura alternativa como você tem na Europa ou na América, onde há espaço realmente de segmentação para o indivíduo poder viver disso. Eu acho que o cara vive na barriga, no peito e na raça, se sustenta porque tem outra profissão, não dá pra viver disso, não tem um reconhecimento, um mérito. É uma questão até prática, de ganhar dinheiro com isso, mesmo que não fique rico, mas de poder se sustentar com música. E a forma como esses caras que estão na cúpula são tratados é como se eles estivessem no mainstream, com mais regalias diante dos meios de comunicação. Era pra ter estrutura de gravadora, estrutura de mídia pra todo mundo poder não ficar naquela ânsia tão grande de estar na MTV e nos principais jornais.

BR-116 - Qual seria a função da cultura alternativa?
Robério Augusto -
Na década de 60 tinha-se uma idéia de que o indivíduo que estava ligado a algum grupo contracultural era ‘melhor’. Eu sou meio conservador nesse ponto. Os hippies ficavam dizendo coisas do tipo 'dizem que somos loucos mas nós é que somos sãos, a sociedade que parece sã é que é louca'. Hoje em dia eu acho que é um padrão que você pode conservar sem necessariamente querer mudar o mundo. Eu acho que são subculturas. Eu não acredito que, no mundo de hoje, a cultura alternativa vá mudar o mundo. A diferença essencial entre os anos 90 e os anos 60 é que nos 60 se pensava em construir alguma coisa. Hoje não. É meio escapista, sabe? Se não é uma válvula de escape, é um ponto de encontro onde você se encontra com os seus parecidos. A função da cultura alternativa é essa, de criar a possibilidade de, se você tem que trabalhar e viver o mundo 'normal' durante o dia, de noite você sair pro seu mundo, que não é necessariamente anormal, apenas diferente. Eu acho que ela não ofereça tanto perigo. Acho que todas as coisas bizarras e aberrações são consentidas.

Thaís Aragão editava o Pub no jornal O Povo e toca na banda Devótchkas

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