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01.03.1999

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MASSIVE ATTACK
SINGLES 90/98
(Virgin)
Por Alexandre Matias

Para compreender o Massive Attack em toda sua extensão não basta apenas ouvir seus três discos (Blue Lines, Protection e Mezzanine). Apesar de serem discos perfeitos, eles não se explicam. É preciso conhecimento musical que vai do reggae ao rap, da house ao dub, do techno ao soul, do R&B ao funk, do rock ao drum’n’bass. A quantidade de informação despejada por 3D, Mushroom e Daddy G sobre seus discos desafia qualquer conhecedor de música pop, que dirá o ouvinte casual.

Por isso a caixa Singles 90/98 (que está sendo lançada no Brasil com o preço sugerido de R$ 95) é um guia e tanto. São as 11 músicas mais importantes da carreira do trio vistas por óticas completamente diferentes, por bandas conhecidas e ases do remix. Cada um observa um lado da banda, como se estivéssemos para entrar num museu com guias que querem chamar mais atenção para os trabalhos que eles mais gostaram, independente da importância, valor ou popularidade.

O primeiro single, Daydreaming, é o mais fraco. Afinal, a versão original, com seus calabouços e porões sonoros, é muito mais interessante que as três versões feitas pelo DJ Blacksmith, que empilha beats frágeis em releituras quase idênticas. O que chama atenção é a inédita Any Love, composta sobre Funk You Up, do trio de rappers velha guarda Sequence - que se encaixaria tranqüilamente entre
qualquer uma das jóias de Blue Lines.

As versões para a belíssima Unfinished Sympathy também não chegam aos pés do original, que é, fácil, uma das melhores músicas dos anos 90. O colaborador do grupo Nellee Hopper carrega nas tintas do R&B, superpondo vocais femininos sobre a canção como se o de Shara Nelson não fosse suficiente. Paul Oakenfold dá um polimento que traz um certo brilho a alguns pontos da canção em seu Perfecto Mix, mas não faz jus ao todo. E a
versão instrumental, a cargo do próprio grupo, não chama mais atenção do que uma versão instrumental poderia chamar.

As mutações começam a partir da faixa de abertura de Blue Lines. Safe From Harm passa por diferentes bisturis no decorrer de seu single: Nellee Hopper abre a canção em momentos chave para untá-los com camadas de teclados house e percussões jamaicanas (meio datado, mas eficaz);
Paul Oakenfold repete a dose (de novo, o Perfecto Mix) lustrando determinadas partes (teclados e baixos) mas esquecendo-se de outras (vocais, principalmente). No final, o grupo junta-se a Hopper para dois dubs: Just a Groove Dub Mix, picotando o funk sombrio da canção original, e Just a Dub, que limpa todos os vocais para deixar apenas a base pulsante que é o cerne da canção.

O remix de Nellee Hopper para Hymn of the Big Wheel segue o padrão de seus remixes anteriores - poucas  mudanças, mais sutis que transgressoras. A inédita Home of the Whale traz o grupo com a irmã do boss da Mo’Wax,  James Lavelle, Caroline, numa canção hermética e quase  silenciosa. Quem acerta a mão neste disco é Oakenfold, que pega a regravação para Be Thankful for What You’ve Got (de William DeVaughn) e a transporta para os anos
70 da black music, com flautas, percussão e uma bela reestruturação do vocal. A versão para Any Love, feita por Larry Heard, veterano da cena house, sai da old-skool e abraça a soul music e beats mecânicos.

Com Sly saímos do caldeirão de groove que é Blue Lines e caímos no perfume perfeito de Protection. A primeira versão do hit, o 7 Stones Mix, fica a cargo de Tim Simenon, o prodígio que, nos tempos da acid house, atendia por Bomb the Bass. Tim limpa a canção, deixando apenas os beats e o vocal, transformando toda a quantidade de instrumentos que no original eram o corpo da música em brisas instrumentais que flutuam de acordo com a vontade do novo autor. O mixer Underdog submete-a a duas cirurgias. Na primeira, o Underdog Mix, que deixa apenas o vocal original, acrescendo um clima de casa de dance suburbana. Na segunda, o Underdog Double Bass & Acapella, explica-se no título, com o baixo apresentado com o dobro do peso,
erguendo o belo vocal que guia a canção aos céus. O single fecha com a primeira aparição de Mad Professor, que a partir daqui se torna constante, mutando o soul tenso da faixa em questão no Eternal Feedback Mix, um dub que faria o velho Black Ark - o estúdio de Lee Perry - renascer das cinzas.

A faixa que batiza o segundo disco abre o sexto CD numa versão da própria banda, saindo do estilo que a voz de Tracey Thorn (Everything But the Girl) impunha à música e caindo na malemolência groove do trip hop. Logo em seguida, Mad Professor volta a repicar com sua tesoura dub, mantendo o groove constante (estourando os
graves) e atirando pedaços da canção como se quisesse se livrar de toda a mobília de uma nave espacial (eles são jogados, mas flutuam), transformando o mix Radiation for the Nation num dos melhores da caixa. E é sempre bom lembrar o estrago que o feiticeiro dub fez nestas duas
canções pode ser sentido em toda sua extensão na
versão que ele fez para este disco, no excelente No
Protection.

Outra versão assustadora entra logo em seguida: entre trovoadas no horizonte, o mestre da não-música Brian Eno surge como uma entidade da natureza, deixando só o vocal de Tracey crescer como uma planta, aos poucos, devagar, lindo em seu Eno Mix. O disco termina com uma versão rap
(scratches, beat acelerado, um sax se repetindo num loop sem nexo) a cargo de J Sw!ft.

O single de Karmacoma é provavelmente um dos melhores. Começa com Geoff Barrow and Adrian Utley (do Portishead) criando a versão Portishead Experience, um groove borbulhante e lento, um trip hop fazendo jus ao termo trip. Ban Young chama a banda italiana Almamegretta para cantar sobre a base de Karmacoma no Napoli Trip Mix e o
resultado é surpreendente (“Jamaica per Roma”, como eles sussurram) com um tempero hindu. O mix U.N.K.L.E. Situation traz a fase de transição do supergrupo inglês, juntando, na mesma faixa, as visões paradisíacas distorcidas de Tim Goldsworthy e do japonês Kudo de um lado e os scratches e grooves do DJ Shadow do outro. No meio, “regendo” James Lavelle. Bumper Ball Dub é, mais uma vez, Mad Professor torcendo e retorcendo a realidade da banda, transformando tudo num túnel de eco e luz sonora, como uma regressão espiritual pode parecer.

À medida que a caixa vai chegando perto do fim, vai melhorando. Os remixes tornam-se mais pessoais e agressivos. No disco oito, entramos em Mezzanine, que nos recebe com a virulenta Superpredators que, como o nome insinua, poderia ser trilha sonora para passeios de dinossauros. A faixa recebe um molho adicional dub por conta de Mad Professor, que esta altura do campeonato já
pode responder como um Massive Attack honorário.

Underdog é o primeiro a meter o dedo em Risingson e enche a música de beats inesperados, que nunca seriam sonhados em sua versão original. The Other Side é outra versão para a mesma faixa, só que mais marcial e com guitarras de fazer inveja a quem se diz rock hoje em dia, feita pelo próprio grupo. Este single termina com uma versão irreconhecível de Risingson feita pelo Underworld,
que anima o original com uma base house, timbres manjados e clima de pista de dança.

O nono disco é Teardrop, que perde toda melancolia, tornando-se assustadora, no Scream Team Remix, a cargo do Primal Scream. A faixa assume ares de exu moderno com um loop que se transforma num berimbau tocado de trás pra frente logo nos primeiros momentos. Em seguida, Mad Professor manda duas pauladas. Na primeira, leva a voz de Liz Fraisier (ex-Cocteau Twins) para o espaço sideral. Na segunda, instrumental, ouvimos apenas o som do espaço. O disco fecha com uma versão claustrofóbica pra Eurochild (de Protection), completamente deformada, morfada na mefistofélica Euro Zero Zero.

Angel continua o clima de medo. Damon Albarn e Grahan Coxon, do Blur, unem-se em sua estréia no terreno dos remixes e calam uma canção que originalmente era a mola-mestra do disco, transformando-a num clima misto THX 1138 e sala de espera de hospital. Logo depois, Mad Professor (ele de novo) transforma Angel num dub aquático,
fazendo a música ter a mesma dinâmica que o original, só que como se estivesse no fundo do mar. O mestre repete a dose no remix de Group 4.

Pra fechar a tampa da caixa, Inertia Creeps aparece em diversas formas. A primeira, guitarrenta e tribal (que torna-se elegia no “refrão”), fica a cargo dos Manic Street Preachers. A segunda, afrotechnóide, percussiva e hipnótica, é culpa de Dr. Gopal Shankar Misra, Uday Kumar Dey e Netai Lal Chakraborty, do Ananda Shankar Experience. E a terceira, macia, suave, mas intrigante, é assinada pelo Alpha, trio de Bristol contratado pelo selo do
Massive, Melankolic.

E no final, o Apocalipse. Reflection é a faixa mais nova do grupo e mistura a atmosfera milenarista com um beat militar, que impõe a dança. Final perfeito para um legado em aberto.

Os textos só poderão ser reproduzidos com a autorização dos autores
© 1999
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