Pensamento do Mês:

O QUE FIZEMOS DE NOSSAS MÃOS?

Amanheci hoje com um enorme desejo de beijar minhas mãos. As mãos são uma das nossas maiores bençãos. Já imaginou você acordar sem elas? Mas quem tem um espírito forte, se sente feliz até mesmo sem mãos e sem olhos. E eu digo isso porque vi, outro dia, uma jovem sem braços, sorrindo para a manhã de sol. Ela parecia uma colegial em férias. Eu vi essa cena e muito me comovi. Não só me comovi como me serviu de lição.

Fomos beneficiados com duas mãos. E elas trabalham juntas. Já disse o ditado que "uma mão lava a outra e as duas lavam o rosto". Está aí uma grande lição. Impossível a mão direita se lavar sozinha e vice-versa. Uma precisa da outra. Está aí um grande ensinamento que a vida nos dá. O ensinamento da solidariedade.

É verdade que eu amo todo o meu corpo. Essa preciosidade biológica que suplanta a preciosidade tecnológica de um computador. Acontece que somos em geral péssimos administradores do nosso próprio corpo, que não foi fabricado, mas criado, que não foi comprado, mas dado. Corpo que envenenamos com álcool, fumo, gorduras e produtos químicos.

Mas... e as mãos? Vejo-as neste momento digitando neste teclado de computador, numa subserviência comovedora. Subserviência ao cérebro que a dirige. Daqui a pouco, vou ao banho, e que seria dele sem elas? Pouco mais, na refeição, são elas que me ajudarão no ato da alimentação. Mal entro no carro e são elas que pegam a chave do veículo, que puxam o cinto de segurança, que seguram o volante. E mais adiante vejo-as acenando para os amigos que vou encontrando no caminho. Elas, muitas vezes, falam por mim. Sim, as mãos falam. Os deficientes visuais têm nelas os olhos que lhes faltam. Dizem que nelas está escrito o mapa de nossa vida, assim como de nossa identidade.

Mãos de operários, mãos de pianistas, mãos de policiais, mãos de marginais, mãos que ajudam, mãos que dão vida, mãos que violentam, mãos de boxeador, mãos que acariciam, mãos que pedem perdão, mãos que arquitetam vinganças, mãos que curam, mãos que plantam, mãos que agradecem, mãos que assinam, mãos que assassinam, mãos que apontam caminhos. Mãos que escrevem, mãos que falam por aqueles que não podem falar... Mãos que hipnotizam multidões. Mãos de Hitler. Mãos que acenam saudades, mãos que erguem brindes de confraternização. Mãos culpadas. Mas elas não são culpadas de serem mal dirigidas. Elas apenas obedecem as ordens que lhes damos. São apenas instrumentos. Tanto podem salvar uma vida através da cirurgia, como podem expulsar um filho do útero, como um intruso. Ah, as mãos que abortam! Mãos que pedem para os outros. Mãos do padre Zé Coutinho. Mãos que limpam lepra. Mãos de Madre Tereza de Calcutá, mãos que trazem mensagens do outro lado da vida. Mãos de Chico Xavier.

Pois é, leitor, como disse no início, amanheci hoje de manhã com um desejo enorme de beijar minhas próprias mãos. Mas por que só as mãos? É que elas são fáceis de serem beijadas. Como poderia beijar meus olhos, beijar meu coração, beijar meus pés? Ah, os pés!... Que seria de minhas caminhadas sem eles?

Mas esta crônica é para as mãos. As mãos merecedoras de muitos beijos. Sei que elas só descansam durante o sono, quando estamos imobilizados, ou quando morremos. Aí elas nada mais podem fazer por nós.

Que responsabilidade possuirmos mãos! Quando chegar a hora de deixar este mundo, uma pergunta nos perturbará: "afinal o que foi que fizemos de nossas mãos?"

Carlos Romero