Conclusão

Do desdobramento de personalidades nascem os “heterônimos” de Fernando Pessoa. Mediante este processo, Pessoa se habilita a ver o mundo como os outros o vêem, explicando, atingindo alguma verdade absoluta dentro da floresta do relativismo que se acha embrenhado.
Os heterônimos são, por isso, meios de conhecer a complexidade cósmica, impossível para uma única pessoa. Em vista disso, Fernando Pessoa multiplica-se em heterônimos-símbolos, como se lhe fosse possível chegar as cosmovisões arquetípicas.

É fácil compreender e provar que toda a diversidade heteronímica de Fernando Pessoa radica numa unidade, que vem das semelhanças substanciais existentes entre os heterônimos e do fato de, afinal de contas, serem eles alter-ego do poeta vendo o mundo cada qual dum ângulo específico. Por outro lado, o processo corresponde a uma genial mistificação, portanto os heterônimos acabam sendo profundamente dramáticos, encarnações, ou máscaras, de que se vale o poeta para um dúplice papel: esconder-se atrás deles para melhor revelar-se mas revelando-se às avessas, ou antes, indiretamente exigindo do leitor um trabalho de recomposição do caminho percorrido pelo poeta em seu mascaramento: esconder-se para se revelar e revelar-se para despistar. Neste sentido, creio ser possível afirmar que Fernando Pessoa chegou a um supremo requinte, no qual só atentamos depois dum profundo contato com os heterônimos. E concluindo, que a poesia ortônima é ainda poesia heterônima. Mais ainda: se pusesse o problema da sinceridade, dir-seia que através de Álvaro de Campos o poeta se revelaria “sincero” e despojado; Álvaro de Campo seria o “Fernando Pessoa” de quem Fernando Pessoa seria heterônimo, como se, na verdade, tivéssemos um poeta, Álvaro de Campos, e um seu heterônimo, Fernando Pessoa.

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