Pintura

Talvez nenhuma época artística tenha sido igualmente rica e com tanto caracter como a pintura renascentista.

Em 1420 manifestou-se a pintura do proto-renascimento; uma década mais tarde Donatello criou São Marcos, depois Brunelleschi com os planos para San Lourenzo.

O novo estilo renascentista foi lançado por um jovem génio de nome Masaccio, que com apenas vinte anos já era um dos grandes da pintura. Foi influenciado pelo proto-renascimento da escultura e arquitectura, tendo o trabalho mais facilitado, mas nem por isso a seu êxito foi menos glorioso.

Infelizmente teve vida curta, morreu aos vinte e sete anos de idade, no entanto ainda teve tempo para criar obras fantásticas.

Em 1425 criou a mais antiga das suas obras, um fresco da Santíssima trindade com Nossa Senhora e São João em Sta. Maria Novella em Florença.

Masaccio. A Santíssima trindade com a Nossa Senhora e S. João. 1425. Fresco. Sta. Maria Novella, Florença.

A secção inferior do fresco ligada a um sarcófago com uma inscrição em italiano, representa um esqueleto jacente. "O que és, já eu fui; o que sou tu virás a ser". Tal inscrição parece-nos mergulhar num meio novo. O que este fresco de Masaccio faz lembrar é a arte de Giotto, na severidade da composição e no volume escultural. Contudo para Giotto, o corpo e as roupagens são um só; as figuras de outros artistas como Donatello e Masaccio são nus que se apresentam vestidos, pois as roupas pendem como verdadeiro tecido.

O cenário do fresco revela um domínio perfeito das técnicas arquitectónicas de Brunelleschi, uma sala abobada, um espaço profundo onde as figuras poderiam movimentar-se à vontade. Mas para ver-mos convenientemente o fresco temos de nos fixar num ponto situado à altura dos olhos. As figuras sobre a abobada são mais pequenas que os doadores mais perto de nós. Portanto a moldura exterior é de "tamanho natural", dá-nos a noção de profundidade ao olhar-nos bem para o fresco.

Traçando agora uma planta do nicho retractado no fresco. Deus-Pai situa-se onde? Ele sustenta a cruz nos braços (primeiro plano), mas os seus pés repousam num suporte na parede (segundo plano). Isto faz pensar qual a verdadeira distancia da superfície da parede. Sendo ela a parte mais recuada da sala, Deus-pai não respeitaria as leis da perspectiva. Muitos críticos são da opinião que Masaccio deve ter tido a intenção de colocar o suporte dos pés de Deus-pai logo por detrás da cruz. Esta teoria pode ser confirmada pela forte sombra que S.João projecta na parede planta do nicho de Santíssima Trindade

Masaccio criou também outras obras além deste ultimo fresco, um dos maiores conjuntos de frescos de Masaccio situa-se na capela Brancacci em Sta Maria del Carmine. O mais famoso deste conjunto de frescos é o pagamento do tributo.

Masaccio. O pagamento do tributo. 1427. Fresco. Capela Brancacci, Sta. Maria del Carmine, Florença

 

 

 

No centro, Cristo ordena a são Pedro que apanhe um peixe, em cuja boca encontrará uma moeda para pagar o tributo. À esquerda em segundo plano Pedro retira o dinheiro da boca do peixe, e à direita do fresco ele entrega-a ao cobrador (não se vê na figura a cima). Como este fresco está a quatro metros do chão Masaccio teve de ordenar a perspectiva de maneira diferente, esperando que olhemos para o ponto de fuga atrás da cabeça de Cristo. Masaccio usa a técnica utilizada pelos Van Eyck, regula o fluxo de luz e usa uma perspectiva atmosférica combinando-os com a luz natural da capela.

As figuras em o pagamento do tributo encontram-se num contraposto perfeitamente equilibrado, apesar de se demonstrarem algo estáticas. Contudo ao tratar-se de uma narrativa transmitida pelos olhares e por alguns gestos é o fresco da expulsão do paraíso que Masaccio demostra o seu talento em representar o corpo humano em movimento. Um fresco alto e estreito não permitiu ao artista criar um colocação espacial digna. Apenas aparece ao fundo a simbólica porta do paraíso, aparecendo Adão e Eva de costas com expressões desoladoras e tristes. Neste fresco o humanismo dos corpos apresentam-se na perfeição

Masaccio. A expulsão do Paraíso. 1427. Fresco. Capela Brancacci, Sta. Maria del Carmine, Florença

 

Apesar de Masaccio possuir belos obras murais, não o é menos na pintura do papel. Um grande trabalho feito em 1426 para igreja das carmelitas em Pisa, veio a dispersar-se por várias colecções. Consistia num painel central representando a Nossa Senhora no trono, tipicamente Florentino. Um fundo dourado, um grande trono com anjos em ambos os lados, uma senhora com o menino comendo um cacho de uvas (que representa o vinho, que é o sangue do salvador), caracterizam este painel. É de referir novamente o cuidado do pintor Masaccio com a delicadeza e perfeição que pintou a luz nas superfícies; as sombras bem definidas de um sol poente vindo da esquerda

Masaccio. Nossa Senhora no Trono. 1426. Painel. The National Gallery, Londres.

A morte prematura de Masaccio deixou um vazio na arte florentina. Mas um jovem contemporâneo, Fra Filippo Lippi parece ter tido um contacto mais próximo com Masaccio. O primeiro trabalho de Lippi é datado 1437, representa também a Nossa Senhora no Trono.

Fra Filippo Lippi. Nossa Senhora no Trono. 1437. Painel. Museu Nacional, Roma.

Esta pintura faz lembrar a virgem de Masaccio, em termos de luz, trono pesado, os mantos e as figuras maciças e tridimensionais. Contudo falta-lhe a monumentalidade e austeridade de Masaccio. É de se notar o fundo doméstico, um livro de orações e um pergaminho com a data. Tantos pormenores e um perspectiva indisciplinada, demonstram um estilo diferente de Masaccio. Mas Lippi teve um interesse fora do vulgar pelo movimento das figuras. E tal como Donatello e Ghiberti, Lippi pintava os mantos escorregando para a esquerda e acentuando a inclinação do corpo para a direita.

BOTTICELLI- Foi aluno de Fra Lippi portanto foi influenciado pela sua técnica. Botticelli pintou o Nascimento de Vénus que talvez foi a melhor de suas obras. Uma leve acentuação dos contornos produzem o efeito de relevo. Existe pouca preocupação com a profundidade do espaço, apenas um pequeno bosque. Os corpos das figuras são esguios e desprovidos de peso ou musculação excessiva. Dão a ideia de flutuar , mesmo quando tocam no chão. Tal como Leonardo Da Vinci, Botticelli nega os princípios fundamentais do classicismo. São autênticos nus em perfeita liberdade de movimentos.

Botticelli- O nascimento de Vénus, Galeria dos Uffizi, Florença

LEONARDO DA VINCI- Foi um dos mais estranhos artistas do renascimento. Nasceu em 1452 na pequena cidade toscana de Vinci.

Leonardo não ligava muito a cânones, ele acreditava que a verdadeira obra era aquela que não era condicionada. Nos primeiros anos de actividade Leonardo criou algumas Madonas, nas quais a luminosidade é dupla, frontal e vinda do fundo. Pretendia assim conseguir criar o efeito de relevo, com o acentuamento dos contornos curvilíneos. A incidência oposta da luz, impede o claro-escuro, proporciona sim o sfumato.

Num destes retratos, o da Ginevra Benci encontra-se já um pouco da polémica anti-Botticeliana. A figura é apresentada quase de frente, produzindo um tipo de beleza em claro contraste com Botticelli. A atmosfera é clara e transparente, favorecendo a figura com a sua expressão característica, que viria a ser desenvolvida em Gioconda.

Leonardo Da Vinci- Ginevra de Benci

Mona Lisa ou Gioconda é o nome a que se dá à maior obra de Leonardo Da Vinci. O delicado sfumato atinge o grau da perfeição, que pareceu milagre aos contemporâneos do artista. As formas são construídas através de várias camadas de tinta, parecendo produzir uma suave luz interior. No entanto Mona Lisa não é famosa pela sua subtileza pictórica. O que fascina os críticos é o modelo e a sua personalidade. O seu misterioso e harmonioso sorriso pode ser lido de duas maneiras distintas: como eco de uma posição momentânea ou como uma expressão simbólica.

Os olhos de Mona Lisa eram igualmente fascinantes, pois parecem mágicos, seguindo-nos para todo o lado, de forma viva e feminina.

É evidente que a Mona Lisa para Leonardo representava a essência da feminilidade. A paisagem é composta por forças vitais da natureza, água e rochas, que desaparecem no infinito da tela, devido ao perfeito sfumato de Leonardo Da Vinci.

Leonardo da Vinci- Mona Lisa, Museu do Louvre

 

Fra Angelico era um frade que criou numerosos frescos para o mosteiro de São Marcos em Florença. A grande Anunciação foi atribuída à data de 1440 ou 1450. Fra Angelico foi lento e o seu estilo não sofreu alterações durante os de 1440, conservando aspectos de Masaccio, a sua dignidade, franqueza e ordem espacial que Lippi tinha rejeitado. No entanto as figuras nunca alcançaram a segurança física e psicológica que caracteriza a imagem de homem do proto-renascimento.

Fra Angelico. A anunciação. 1440-50. Fresco. S. Marcos, Florença

Em 1439 veio para Florença Dominico Veneziano. Ele criou a virgem com o menino foi um dos primeiros painéis de altar. Nesta pintura S.João olha para nós enquanto aponta para a virgem, repetindo o gesto da virgem de Masaccio. As figuras possuem o equilibro e dignidade das de Masaccio, mas não o mesmo peso e volume. No entanto os corpos delgados e expressivos fazem lembrar Donatello.

Domenico veneziano. A virgem com o menino e Santos. Galeria dos Uffizi, Florença

 

 

PIERO DELLA FRANCESCA- Quando Domenico Veneziano se estabeleceu em Florença teve como ajudante um rapaz chamado Piero della Francesca que veio mais tarde a ser um dos grandes do proto-renascimento.

Teve uma longa carreira, a sua obra mais importante é um ciclo de frescos na capela-mor da igreja de S. Francisco, em Arezzo, que ele pintou entre 1452 e 1459. Os frescos representam a lenda de vera cruz. Com a Imperatriz Helena, as cruzes de Cristo, onde a verdadeira cruz é identificada pelo seu poder miraculoso de ressuscitar um jovem.

 

 

pormenor do fresco O achamento da verdadeira cruz.

 

Piero e Dominicano estão bem ligados pelas cores que ambos usavam.

As figuras de Piero tem uma grandeza austera que faz lembrar Masaccio e Giotto, mais que Dominico. Os homens e mulheres de Piero são bastante idealizados, mostrando figuras heróicas, belas, fortes e silenciosas. Mas como Piero conseguiu criar estas imagens extraordinárias? Tudo começou pelo gosto pela prespectiva, e por acreditar que a prespectiva cientifica era base de toda a pintura.

Piero também criou outras obras como é o caso do baptismo de Cristo onde se encontra uma paisagem aberta para o horizonte plena de luz clara e transparente.

Piero della Francesca, O baptismo de Cristo, 1440-50

Outro fresco fantástico é o da Madona com o menino; um semicírculo de santos rodeando a virgem, meio inseridos na cavidade da abside, onde o artista teve imaginação para criar uma concha no tecto.

A luz e a sombra estão presentes por uma abertura ou janela vinda da direita das figuras, toda estes jogos de luz e sombra estão bem definidos. A figura cónica da virgem está perfeitamente definida pela sua postura.

É tudo isto que faz deste fresco um dos melhores de Piero, a ultima pensa-se, visto o artista ter perdido a vista nos últimos anos da sua vida.

Piero della Francesca, A virgem e os Santos.

 

ANDREA DEL CASTAGNO- Mas não só Piero conseguiu criar o efeito de prespectiva, a terceira dimensão não representava qualquer dificuldade para Andrea del Castagno; ele que foi o mais dotado pintor florentino da geração de Piero. Capaz de captar um pouco da monumentalidade de Masaccio, na sua ultima ceia.

Andrea del Castagno. A última ceia, 1445-50. Fresco. Sta. Apollonia, Florença

 

A cena situa-se num vasto nicho ricamente apainelado. Tal como as representações medievais do tema, Judas encontra-se isolado; a comunicação entre os apóstolos é mínima, apenas simples gestos e olhares passivos.

Castagno sentiu-se limitado por rígidas exigências da tradição de perspectiva, recorrendo a um método para quebrar a simetria. Em cinco dos seis painéis da parede ele colocou mármores de cores esbatidas, mas por cima das cabeças de Judas, S. Pedro Cristo colocou um painel com veios explosivos, de modo a parecer cair um raio sobre a cabeça de Judas.

Cinco anos mais tarde castagno executou o admirável David pintado num escudo de couro. David mostra-se vitorioso, e com um certo movimento dado pelas roupagens, cabelos agitados pelos ventos.

Esta pintura de David foi o primeiro exemplo da tendência que predominava na segunda metade do século.

Andrea del Castagno. David. The national Gallery of Art, Washington, D. C. ( colecção Widener)