O Império Contra-Ataca

Assim era o mundo quando O Império Contra-Ataca chegou aos cinemas, em 1980: Guerra nas Estrelas já havia consolidado seu status de fenômeno pop, e George Lucas caminhava a passos largos para o topo da lista dos homens mais ricos e influentes do show biz. A Industrial Light & Magic ia se estabelecendo como a maior produtora de efeitos visuais do planeta, Harrison Ford estava em vias de se tornar um astro (ou o maior de todos os astros) e Carrie Fisher afundava na dependência da cocaína. Como se pode observar, todos estavam satisfeitos com o sucesso do primeiro filme, mas o mundo nem sequer imaginava o que ainda estava por vir.

Algumas coisas já eram esperadas, como a volta de Darth Vader - que escapara da morte certa no final de Guerra nas Estrelas -, e a continuação do treinamento Jedi do jovem Luke Skywalker. O elenco se preparava para enfrentar mais alguns meses de trabalho duro e, ao mesmo tempo, divertido. Para dirigir o segundo episódio da trilogia (e quinto da saga), George Lucas chamou o experiente Irvin Kershner, que contabilizava em seu currículo filmes como A Volta do Homem Chamado Cavalo (1976) e Os Olhos de Laura Mars (1978). Além disso, com a excelente bilheteria de Guerra nas Estrelas, não havia como O Império Contra-Ataca ser um fracasso.

Esperar o sucesso é uma coisa; mas a transformação de um fenômeno cinematográfico numa complexa saga multimídia pegou a todos realmente de surpresa. O Império Contra-Ataca extrapolou tudo o que Guerra nas Estrelas apresentara: de um conto de fadas espacial passou-se a uma intrincada saga de proporções trágicas e místicas, capaz de ao mesmo tempo gratificar a inteligência da platéia e não deixar um segundo para que ela respirasse nas inúmeras cenas de ação. Em resumo: O Império Contra-Ataca, além de ser considerada pelo público e pela crítica o melhor filme da trilogia, é também uma das maiores aventuras já exibidas na telona.

Mas o parto não foi nada suave, com problemas pipocando já na primeira cena. Explica-se: pouco antes do início das filmagens, o ator Mark Hamill - que interpreta Luke Skywalker - dirigia seu BMW quando, numa curva mais fechada, sofreu um grave acidente. Seu rosto foi seriamente ferido e, mesmo após diversas cirurgias plásticas, ele não conseguiu se recuperar totalmente. A solução encontrada por Lucas foi acrescentar, logo no início do filme, a cena em que Skywalker é atacado por um ice wampa no planeta gelado de Hoth. O rosto do herói da Aliança Rebelde é danificado e depois reconstruído plasticamente pelo andróide médico, 2-1B.

Além disso, o ego de Harrison Ford crescia à medida que sua fama galopava. "Dono" do piloto Han Solo, o personagem mais carismático da série, ele sabia que estava destinado a uma carreira gloriosa e começava a exigir que seu rosto fosse estampado com maior destaque no cartaz do filme, entre outros mimos. Carrie Fisher, por sua vez, passou as filmagens inteiras, de ponta a ponta, literalmente chapada. Sem saber como lidar com a fama instantânea que viera com o primeiro filme - aliada ao peso de ser filha de um dos maiores ícones dos anos 50, a atriz Debbie Heynolds, de Cantando na Chuva -, ela se entregava mais e mais ao vício da cocaína e à depressão.

Mas nada disso impediu que O Império Contra-Ataca crescesse e se ramificasse. Situado cronologicamente três anos após os acontecimentos de Guerra nas Estrelas, o filme traz os personagens desenvolvidos com muito mais apuro que no episódio anterior. Luke Skywalker não é mais um jovem idealista e ingênuo; ele se torna cada vez mais poderoso, aprendendo a utilizar a Força para se tornar um cavaleiro Jedi. Han Solo se envolve emocionalmente com a Princesa Leia que, por sua vez, tem um relacionamento misterioso - e muito mal explicado - com o jovem Skywalker.

O salto tecnológico do primeiro filme para sua seqüência também é gritante: a batalha em Hoth, com os caças rebeldes protegendo a base dos Andadores Imperiais AT/AT, impressiona até hoje por sua perfeição técnica e riqueza de detalhes. Com a utilização de técnicas de stop-motion Irvin Kershner conseguiu tornar criaturas alienígenas, como os Tauntaun mais realistas - isso tudo sem utilizar gráficos digitais, que então não existiam. Além disso, O Império Contra-Ataca se revelou um desafio bem maior do que o filme original porque, à exceção das seqüências passadas em Hoth - filmadas inteiramente na gelada Noruega -, todo o filme foi feito em estúdio, incluindo o planeta pantanoso de Dagobah e a Cidade das Nuvens do planeta Bespin. Ao todo, foram utilizados 64 sets de filmagem diferentes.

Novos persanagens foram acrescentados à saga, aumentando o número de fãs e dando continuidade à construção de um universo sem paralelos na cultura pop mundial - que envolveu outras mídias como livros, revistas em quadrinhos e até novelas de rádio. O mais marcante desses novos personagens é Yoda, o mestre Jedi que tem mais de oitocentos anos de idade e mora num casebre perdido no sistema Dagobah. Responsável pelo treinamento de Obi-Wan Kenobi e - em parte - de Anakin Skywalker, ele inicia os ensinamentos de Luke, mostrando que os únicos limites da Força estão em sua mente. Refugiado em seu remoto pântano para se esconder do Imperador e de Darth Vader, Yoda sabe da verdade envolvendo o pai de Luke Skywalker, uma revelação que chocou platéias do mundo inteiro. Embora o mestre Jedi fosse um boneco de animatrônica, a interação dele com o ator Mark Hamill é tão perfeita que é impossível olhar para Yoda e duvidar de que ele não seja uma criatura viva e pensante.

Outro personagem fundamental para a saga é Lando Calrissian, administrador da Cidade das Nuvens, no planeta Bespin. Antigo proprietário da nave Millennium Falcon, ele possui uma forte relação com Han Solo - embora ambos não hesitem em, às vezes, trapacear-se amigavelmente. Preocupado com o futuro de Bespin, porém, Lando entrega seu amigo a Darth Vader - mas, arrependido, logo se torna aliado dos rebeldes que desejam derrubar o tenebroso Império. As diversas referências ao passado dos personagens ajudaram o público a reconhecer a saga como algo que transcendia as telas - o que, obviamente, contribuiu para o crescimento do culto.

E o persanagem mais cultuado de O Império Contra-Ataca é sem dúvida o caçador de recompensas Boba Fett, que captura Han Solo e o leva, congelado em carbonita para o criminoso Jabba. O culto a Fett se tornou tão grande que, assim que o filme chegou aos cinemas, foram lançados dezenas de livros e histórias em quadrinhos abordando as origens e a vida do personagem. Para se ter uma idéia. existem dezenas de sites na Internet dedicados exclusivamente ao mercenário com trajes de guerreiro Mandalore.

Com cada um dos elementos do filme sendo esmiuçados por uma crescente legião de fãs, é possível avaliar o quanto a seqüência de Guerra nas Estrelas contribuiu para aumentar o mito em torno da série, até torná-lo uma verdadeira obsessão.

O filme dirigido por Irvin Kershner também revelou um dos segredos mais bem guardados da saga: a verdadeira identidade do pai de Luke Skywalker - que é o próprio vilão da série, Darth Vader. Antes de ser seduzido pelo lado negro da Força, Vader era Anakin Skywalker, discípulo de Obi-Wan Kenobi. Mas, impaciente com o ritmo de sua conversão à ordem dos Jedi, Anakin traiu seu mestre e aliou-se ao Imperador - eventos que provavelmente serão vistos na nova trilogia, a partir de 1999. O clima de mistério era tão grande que, na cena em que Vader vence Luke na Cidade das Nuvens, o ator David Prowse - o corpo do personagem - revelava: "Obi-Wan Kenobi é seu pai". Só quando o ator James Earl Jones foi colocar seu vozeirão a serviço de Vader é que Lucas lhe disse para mudar a frase para "eu sou seu pai". Dessa forma, seria impossível a algum espião infiltrado no set de filmagens entregar o mistério e estragar o impacto do filme.

Para fechar seu épico com brilhantismo, George Lucas radicalizou, deixando todas as situações em aberto. O destino de Han Solo permaneceu sem solução, as forças do Império Galáctico conquistaram uma vitória decisiva sobre a Aliança Rebelde, e Luke não conseguiu se tornar um cavaleiro Jedi. Nunca um desfecho foi tão anticlimático e tão perfeito. Lucas não só superou o filme original em qualidade como manteve a ansiedade dos fãs no nível máximo até 1983, quando O Retorno de Jedi foi lançado. Mas nada, nenhum outro elemento do vasto universo que compõe a saga de Guerra nas Estrelas, é tão memorável quanto O Império Contra-Ataca: um filme sutil, rico e também discreto, que, mesmo sendo freqüentemente lembrado como o elo mais forte da saga, ocupa um cantinho misterioso na mente dos fãs. Aquele cantinho sagrado e intocável, que só encontra satisfação quando se assiste ao filme outra vez. A simples lembrança não basta. E, não importa quantas vezes se veja a obra de Lucas e Irvin Kershner, nunca será demais.

Roberto Sadovski
SET Edição Especial, 1997


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